Um ano feliz a ser criado

A expressão que mais se ouviu, nestes dias, quase como um mantra, foi: “Feliz Ano Novo!” Mas, o ano de 2017, que acaba de chegar, pode trazer tudo, mais, menos ou quase nada do que sonhamos, desejamos e projetamos. O pacote completo de felicidade, cronologicamente, não começará no dia primeiro de janeiro e nem terminará no dia trinta e um de dezembro. Muito do que devia ter sido feito, em 2016, não foi feito. A conta não fechou. E este vai ser um ano feliz? Depende. De quê e de quem? Um ano é como um prato de comida, difícil de ser preparado e, às vezes, de ser digerido. Depende das matérias-primas e das habilidades das cozinheiras. O ano feliz depende menos de simpatias, calendários e cronologias: minutos, horas, dias, semanas e meses. Depende menos dos ciclos da natureza: dia, noite, sol, chuva, lua, calor… Depende menos, até de Deus. Mas, depende, sobretudo, de nós, seres humanos: de nossas ações e atitudes, posturas e composturas e de nossos hábitos sociais, políticas, econômicas e culturais. Fomos nós que estragamos e quebramos o Brasil. De onde vieram as guerras, violências, brigas, paixões, cobiças, invejas, crimes, corrupções, ideologias, politicagens, vulgaridades, mediocridades, crises e tensões porque passa o Brasil (cf. Tg 4,1-4)? Se continuarmos agindo como em 2016, não haverá ano feliz para ninguém. Vale aqui um velho conselho: nem otimismo demais, nem pessimismo demais; nem muito céu, nem muita terra; tudo, na medida certa. Como ser otimista em tempo de crise? Somente com a fé, o amor e a esperança. E o que fazer prioritariamente? Reconciliação: curar as feridas sociais, políticas, econômicas e culturais.

Para ser, de fato, feliz, este ano precisa ser criado. Para isto, é bom começar com estas sábias palavras: “Ore por grandes coisas, espere grandes coisas, trabalhe para alcançar grandes coisas, mas acima de tudo, ore” (R. A. Torrey). “Ore como se tudo dependesse de Deus e trabalhe como se tudo dependesse de você” (Santo Agostinho). “Aja como se tudo dependesse de você, sabendo bem que, na realidade, tudo depende de Deus” (Santo Inácio de Loyola). “Cada cristão, então, sabe bem que pode fazer tudo aquilo que puder, mas que o resultado final depende de Deus: é esta consciência que o sustenta no cansaço de cada dia, especialmente  nas situações difíceis” (Papa Bento XVI). Neste ano, embarcarei na sabedoria do papa Pio XII: “É preciso recuar um passo, para poder avançar outros três”.

A melhor imagem para exemplificar este ano que acaba de nascer é a do velho Simeão, abraçado ao Menino Jesus (Lc 2,28): continuidade-descontinuidade – o antigo abraçado ao novo e o novo nos braços do antigo. Aliás, Jesus nos oferece duas preciosidades, nas pequenas parábolas da semente que cresce por si próprio e da semente de mostarda (Mc 4,26–34). As duas parábolas representam o crescimento e o contraste. O crescimento e o contraste entre a pequenez da semente e a grandeza daquilo que produz vêm graças ao dinamismo inserido na própria semente. O grão de mostarda, a menor de todas as sementes, pleno de vida, quebra o solo, nasce, cresce e se torna a maior de todas as plantas da horta. A fragilidade é a força da semente e a ruptura é sua potência. Assim deverá ser ano feliz que desejamos.

E esta é, de fato, o banco de prova para se recriar o Brasil, a fim de que, enfim, tenhamos um ano feliz. Fixemo-nos, então, neste provérbio africano: “Gente simples, fazendo coisas pequenas, em lugares pouco importantes, consegue mudanças extraordinárias”. Ações humanas pequenas, de quem não é importante aos olhos do mundo, porque pequeno e pobre de coração, que não confia na própria força, mas no poder do amor de Deus, podem tirar o Brasil do atoleiro e da quebradeira em que se encontra.

Fiquemos, portanto, certos, como dois mais dois são quatro, que no correr de 2017, Deus continuará atuando, permitindo, impedindo, aceitando, respeitando, intervindo e agraciando. Mas o ano feliz dependerá muito e mais de nós. Que este seja um ano marcado por profecia, humildade, discernimento, criatividade, proatividade, esperança e misericórdia. Feliz ano para todos e todas.

* Dom Pedro Brito Guimarães é arcebispo de Palmas (TO).

 

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