Uma Igreja em comunhão e missão: A experiência transformadora do Sínodo na escuta e Evangelização com o coração misericordioso.
O Sínodo foi um tempo de graça e de sentir a presença de Deus em minha vida. Também de aprendizado, escuta, diálogo, partilha e cultivo da espiritualidade sinodal. Em meio a diferentes idiomas, ministérios, carismas, dons, realidades e até confissões religiosas, testemunhamos a comunhão e a universalidade da missão da Igreja.
Minha experiência começou com a convocação do Papa Francisco para as Igrejas locais: Como ser uma Igreja comunhão, participação e missão? O que as pessoas esperam da Igreja? Fomos chamados a ouvir não somente quem está dentro das pastorais e movimentos, mas escutar os que estão fora, nas periferias geográficas e existenciais, nos lugares por onde quase ninguém vai ou a Igreja deixou de ir.
Fiz a escuta em Montes Claros/MG, com catadores de material reciclável, encarcerados, mulheres vítimas de violências, pessoas em situação de rua. O interessante é que escutei essas pessoas como CNLB e como Comissão Missionária Paroquial (Comipa), embora já conhecesse esses lugares como profissional do Serviço Social. O diferencial foi fazer as visitas com o espírito do Sínodo e, mais que falar, estar ali para escutar com o coração misericordioso. Isso me fez avaliar nossa ação evangelizadora, nossas metodologias, as formas de chegar, escutar e responder.
Escutar é difícil, não fomos educados para escutar. Assim como os discípulos tentaram silenciar Bartimeu, que gritava a Jesus para ter piedade e curá-lo da cegueira, tentamos silenciar os Bartimeus de hoje, para não ouvirmos suas interpelações. Falaram de estruturas de Igreja que não as acolhem ou não dialogam com a realidade onde estão. Questionaram a ausência da Igreja junto aos pobres, mulheres de periferia, mães-solo, agentes de pastoral feridos pelas estruturas fechadas. Mas também falaram da alegria de ver a presença profética da Igreja na promoção dos direitos humanos, na defesa da vida, no cuidado com a Casa Comum.
Essa escuta me fez crescer como mulher, cristã leiga e profissional. Todas estas situações foram trazidas para a mesa de diálogo, em clima de escuta e discernimento. O Sínodo recupera a Igreja Povo de Deus do Vaticano II. Discutimos a Evangelização de hoje, que em muitos lugares, com suas estruturas fechadas, proibitivas, clericais, deixaram de ser acolhedoras e misericordiosas. Na Igreja clericalista não há diálogo nem acolhida, mas autoritarismo e poder. Por isso, fomos chamados a desclericalizar a Igreja, ser uma Igreja ministerial, valorizar as mulheres que animam as comunidades e testemunham a missão nas realidades do dia a dia. Valorizar os jovens, crianças e idosos.
Na homilia do último dia do Sínodo, o Papa Francisco nos pediu uma Igreja de pé, missionária, que caminha com o Senhor pelas estradas do mundo, ouve o grito da humanidade e leva a luz de Cristo aos outros. Ele falou muito em conversão das estruturas, e isso é destacado no Documento final. Penso que o jeito de Francisco contagiou os delegados do Sínodo, que apontaram formas simples e concretas de fazer sinodalidade, escutar os sinais dos tempos, fazer da Igreja uma tenda de inclusão onde há lugar para todos, para todos. Os pobres estão no coração da Igreja, e para isso é preciso sair e ir ao encontro. A missão da Igreja exige que todo o povo de Deus esteja em caminho e juntos, e cada membro a desempenhar o seu papel: o de anunciar Jesus ao mundo.
Todo esse processo foi muito significativo, mas faço alguns destaques: os testemunhos e retiros nos fizeram entrar em contato conosco e com Deus. A visita às catacumbas lembrou como é urgente recuperar a profecia e o testemunho dos primeiros cristãos. As vigílias e a reza do terço trouxeram a religiosidade popular, tão forte na América Latina. É preciso priorizar a formação em todos os âmbitos e ser presença junto aos pobres.
Temos agora, nas comunidades e Conferências Episcopais, o desafio de ser embaixadores da Igreja Sinodal. Precisamos começar por nós mesmos, caminhar unidos na missão, criar estruturas acolhedoras, inspirar-nos em Jesus e Maria Madalena, a discípula que sai sem medo na noite escura e, ao amanhecer, anuncia a alegria e a esperança do Ressuscitado. O grande desafio agora é procurar conhecer o documento final em nossas comunidades, colocá-lo em prática, para que a espiritualidade e o jeito sinodal alimente o nosso ser Igreja, que é o jeito para Jesus acontecer aqui e agora.
Por Sônia Gomes de Oliveira
Crista leiga da Arquidiocese de Montes Claros. Presidenta do Conselho Nacional do Laicato do Brasil – CNLB
Texto publicado na Revista SIM – Setembro a Dezembro de 2024