Em 1999 a ONU decretou 25 de novembro como o dia para não esquecer as mulheres vítimas da violência. Houve progressos legislativos, mas sobre a proteção ainda há muito a ser feito, como recorda a Irmã Rita Mboshu Kongo, teóloga congolesa.
Em 1999, por causa de um crime ocorrido na República Dominicana em 1960 no qual foram violentamente assassinadas três irmãs, a Assembleia das Nações Unidas declarou oficialmente 25 de novembro como o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres. “Las Mariposas” ou seja, “as borboletas”, assim eram chamadas as irmãs da família Mirabal. Patria, Minerva e Maria Teresa foram mortas em 25 de novembro de 1960 na República Dominicana pelos homens do ditador Trujillo, que as perseguiram por muitos anos, antes de decretar sua morte violenta e desdenhosa, mas que também sancionou o fim de seu regime. O voo de um penhasco das três irmãs dentro de um jipe, depois de torturadas e violentadas, tornou-se o voo das borboletas livres, de mulheres que foram capazes de dizer não aos prepotentes. É por isso que, com o tempo, se tornaram o símbolo da emancipação feminina.
Violência e pandemia
Em junho passado, a ONU divulgou um relatório do Fundo das Nações Unidas para a População, Avenir Health, da Universidade Johns Hopkins e Universidade Victoria da Austrália, que destacou o claro aumento dos casos de violência contra as mulheres durante a pandemia: mais de 15 milhões de casos com um aumento de 20% de violência durante os primeiros 3 meses de isolamento em todos os 193 países membros da ONU. É uma praga que percorre o mundo; nos EUA, em plena emergência sanitária, a cada minuto uma mulher é abusada por seu parceiro; em Londres, nas primeiras seis semanas de lockdown, foram feitas 4.000 prisões por abuso doméstico.
Um trágico aumento de casos em todo o mundo
Números dramáticos da América Latina. Quase 50 feminicídios (um termo mais correto que substituiu o “crime passional”) em apenas dois meses na Argentina. No México, de fevereiro a abril foram assassinadas 367 mulheres, em El Salvador as autoridades haviam reportado 9 feminicídios no primeiro mês do isolamento, mas teme-se que o número seja maior. No Brasil, houve um aumento de 56% de violências em março, em seis estados. Com o lockdown, as chamadas para linhas de ajuda dobraram no Líbano, Malásia e Austrália, as buscas no Google registraram o maior volume de pedidos de ajuda por violência doméstica dos últimos 5 anos. O Secretário Geral das Nações Unidas, Antonio Guterres, exortou todos os países a tomar medidas contra este “aumento chocante” da violência.
Não números, mas pessoas
Portanto, existe uma outra pandemia, uma “pandemia escura”, que afeta milhões de pessoas, de mulheres. Neste vídeo das Nações Unidas, por ocasião do dia de hoje, lembra-se que, neste tempo marcado pela Covid-19, a violência doméstica está em crescimento… Neste momento, muitas pessoas estão bloqueadas em suas casas. As histórias de mulheres que sofrem violência todos os dias em todo o mundo não são dados estatísticos. São também rostos desfigurados, corpos cobertos por hematomas. Vidas vividas em em jaulas de medo e de violência. “Os dados sobre a violência contra as mulheres – é sublinhado no vídeo da ONU – não são apenas números, são pessoas que você poderia conhecer”.
Investir na educação
Irmã Rita Mboshu Kongo, teóloga congolesa e professora da Pontifícia Universidade Urbaniana de Roma, reitera que há um longo caminho a percorrer para combater o fenômeno da violência contra as mulheres. “É preciso trabalhar, segundo a minha experiência, na educação e na formação. Estas são as prioridades. É necessário educar para conhecer uns aos outros – afirma – para dialogar, envolvendo a família, a escola e a Igreja para assim recordar do ‘Pacto educativo global’ que o Papa Francisco promoveu”. É fundamental, sugere Irmã Rita, entender profundamente o sentido do relacionamento, sem esquecer que todo homem é uma imagem de Deus e que a violência contra a mulher é violência contra o Criador.
Falando da situação em seu país, o Congo, a teóloga lembra que as mulheres sofrem violência, racismo e também o sexismo. “Humilhando as mulheres”, afirma Irmã Rita, “humilha-se a família. Humilhar a família também humilha a sociedade, a cultura em que vivem, o clã, a aldeia ou o país. A Igreja no Congo está tentando fazer um trabalho complexo de tentar desvincular preconceitos, não é simples, mas também não é impossível”. A teóloga é uma religiosa também comprometida em trazer à tona o tema da violência contra as irmãs na Igreja. Há cerca de um ano, o problema foi abordado em sua complexidade, “hoje – ela aponta – a Igreja está trabalhando, há mudanças, é um processo no qual a Igreja certamente não tem sido surda ao grito de sofrimento de muitas religiosas”.
Em conclusão, o convite é o de falar claramente. Falar muitas vezes não é fácil, há obstáculos de vários tipos que levam as mulheres a escolher o caminho do silêncio como se isso apagasse o problema. É necessário apoio, solidariedade, saber que não se está sozinho, somente assim será possível sair da escuridão e ter a força para lutar contra a injustiça sofrida, muitas vezes gratuita e sem sentido.
Fonte: Vatican News