de Simone Filadelfo
As guerras, os regimes ditatoriais, fome, pobreza extrema e as mais diversas dificuldades, em países da África Subsaariana são os fatores predominantes para que as pessoas queiram sair de seu país de origem e fugir para a Europa em busca de refúgio.
Segundo relatos de imigrantes, os Líbios oferecem e cobram por um suposto “serviço de transporte” no meio do deserto. São carros grandes, abertos, superlotados e que seguem em alta velocidade. Algumas pessoas chegam a cair, e ficam pelo caminho, porque eles não param. “A impressão que dá, é que o propósito é derrubá-los mesmo”, analisa a jornalista e missionária Scalabriniana Rosinha Martins, que esteve o mês passado na região da Sicília e acompanhou a chegada dos imigrantes no porto de Augusta, cidade vizinha de Siracusa.
Em entrevista, a religiosa contou diversos casos de pessoas que explicaram sua difícil trajetória no deserto; sequelas que vão desde traumas físicos até psicológicos. Eles saem com pouco suprimento e a comida acaba no meio do caminho, em pleno Saara, e o medo de “morrer de fome” é um dos principais relatos. Psicologicamente falando, o trauma também é grande. Ver corpos e ossos espalhados naquela imensidão causam tristeza e desespero.
Ainda de acordo com Irmã Rosinha, “para conseguir algum dinheiro que possa ajudá-los na subsistência, os imigrantes prestam serviço aos Líbios, porém quando cobram o que lhes é devido, acabam sendo torturados, levam tiros nas pernas e se tornam deficientes e outros são assassinados. Encontrei imigrantes em hospitais de Reggio Calabria sem as pernas. Me vem as lágrimas, pois não consigo me conformar com tamanha atrocidade. Meu Deus, ninguém fará nada? Onde estão as comunidades internacionais? Não conseguem enxergar que a Líbia se tornou um campo de concentração que mata, que extermina os imigrantes e os odeiam? ”
Já as mulheres, relata, sofrem com o abuso sexual. Elas são estupradas e chegam grávidas e desnudas ao porto. Quando conseguem desembarcar, são imediatamente cobertas pela Guarda Costeira. “Algumas chegam chorando e gritando “eu não quero esse filho”, explica Rosinha. Sabe-se que essa gravidez é fruto de estupro e o desespero é grande.
Como a viagem é longa e cansativa, cresce o número de atravessadores que se aproveitam da vulnerabilidade e exaustão dos estrangeiros. Nessa região a imigração é um grande negócio. O resultado dessa exploração resume-se em tortura, abuso sexual e morte; sem que nada seja feito pelas comunidades internacionais para evitar esse disparate.
Essa situação acontece porque mesmo após a morte do Coronel Muammar Kadafi, que governou a Líbia em regime ditatorial durante 42 anos, o país ainda vive resquícios e conflitos constantes, apesar da implantação do Estado democrático.
O ano passado a imprensa internacional já havia veiculado o panorama de um país em caos e refém de grupos terroristas. Apesar da intervenção da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), responsável por intermediação de alianças militares, houve a tentativa de transformar a Líbia em um governo funcional e democrático, no entanto, o resultado foi exatamente o oposto, e a situação ficou fora de controle.
O trajeto tem como rota, o Saara, o maior deserto do mundo. Insólito, cujas chuvas são raras e a temperatura pode chegar a 50º C. E esse é o caminho para chegar à Líbia, país mais próximo da porta de entrada ao sul da Itália.
Alegria após a chegada e a acolhida
Apesar de todo sofrimento e dificuldade, a chegada ao Porto de Augusta, em Siracusa, é um alívio para os imigrantes. “A alegria me chamou atenção. Para eles é uma vitória.”, conta de maneira emocionada a jornalista e missionária Rosinha.
No porto, o serviço de acolhida é feito pelas Irmãs Scalabrinianas e voluntários, que os encaminham para o banho, recebem roupas limpas e alimentos. São aproximadamente 2000 tendas para estada, até que o governo faça a liberação desses imigrantes. Esse processo acontece de 7 a 15 dias.
Líbia, a África “branca”
A região denominada África Mediterrânea, que compõe a Líbia limita-se com o Egito, Sudão, Tunísia, Argélia, Níger e Chade e embora, africanos, a maioria da população é branca. Eles são locais colonizados por países como França, Reino Unido e Itália.
Ainda na época de Kadafi, os casos de racismo e xenofobia eram grandes. Como o ditador havia recrutado grande número de africanos negros para a defesa do seu governo, as milícias consideraram todos os negros, sem exceção como inimigos. E desde então cresceu a intolerância.
Em 2012 a Anistia Internacional esteve em centros de detenção na Líbia e puderam identificar cicatrizes originadas pelos maus-tratos e surras que os prisioneiros recebiam com fios elétricos e chicotes de borracha.
Denúncia da OIM contra Mercado de Escravos na Líbia
Na terça-feira dia 11, a Organização Internacional para Migrações (OIM), órgão das Nações Unidas (ONU) denunciou o tráfico de pessoas e mercado de escravos.
A denúncia é de que muitos migrantes morreram de fome e doenças. Os corpos foram encontrados em valas comuns.
Fonte: Imprensa Scalabriniana São Paulo