Por Marcos Bento*
Um encontro com Cristo transforma a nossa vida completamente e nos abre para as relações de reciprocidade, permitindo-nos entender que missão não é uma estratégia de proselitismo, mas o reconhecimento do encanto pela vida.
Como Jesus, que na sua experiência humana devolveu o encanto da vida e em tudo se orientou para o Pai – até mesmo sua morte foi para a glória de Deus (Jo 12,23), os presbíteros são chamados a serem homens apaixonados por Deus e por sua missão. Sem um amor oblativo não há missão, pois ninguém vai ao encontro do outro para proclamar uma Boa Notícia sem antes apaixonar-se por seu conteúdo.
Tendo em vista essas considerações, a questão missionária na formação inicial dos presbíteros é algo indispensável. Porém, em muitos seminários e casas de formação, está na hora de um evangélico despertar missionário. Infelizmente, para alguns seminaristas, missão se reduz às experiências ad gentes, às atividades pastorais dos finais de semana, do mês missionário e dos períodos de férias. Para outros, o cenário cultural em que vivemos não necessita de missionários em saída, mas sim de boas estratégias de evangelização. Como a globalização facilitou nossa vida, não é mais necessário sair para pregar quando se pode fazer uma transmissão ao vivo ou postar textos bíblicos nas redes sociais digitais. Por causa disso, cultivar e incentivar uma espiritualidade que reforce nossa identidade missionária dentro dos seminários não é tão simples, pois a ideia de missão impregnada na mente de muitos seminaristas e formadores não corresponde àquele estilo de vida assumido por Cristo.
Apesar das motivações imbuídas de entusiasmo missionário presentes no Documento de Aparecida, nas Diretrizes para a Formação dos Presbíteros da Igreja no Brasil e, principalmente, no magistério do Papa Francisco, a missão ainda continua como opção de poucos, como se fosse um acidente na vida de alguns vocacionados ao sacerdócio.
Inegavelmente, há um hiato preocupante entre o Evangelho, as orientações presentes nos documentos oficiais da Igreja acerca da formação presbiteral e o que acontece na formação inicial dos presbíteros: faz-se missão sem incentivar o ser missionário. Limitados a uma questão laborativa, não é raro escutarmos, de formadores e professores, que nós precisamos “fazer missão”. Ora, mas se a missão é um trabalho a fazer, ela pode ser realizada num intervalo pequeno de tempo, logo não passa de um serviço passageiro. Para que então falar com tanta insistência que a vida presbiteral é uma vocação específica dos continuadores da missão de Jesus? Nos encontros vocacionais, distingue-se vocação de profissão pela integralidade com que se vive a primeira. Diferentemente de todo profissional que tem uma carga horária de trabalho específica, um padre, um religioso, uma religiosa, um pai e uma mãe vivem sua vocação a todo instante.
Continuar a missão de Jesus não é só desenvolver atividades pastorais ou sair de casa em casa falando do Evangelho, mas sim abraçar o seu estilo de vida e testemunhar concretamente o seu amor. De fato, Jesus não fazia missão, mas vivia em missão.
Por conseguinte, para recuperarmos o sentido evangélico da missão e romper com a limitada ideia de que uma das dimensões da formação presbiteral é missionária, nossa primeira insistência deve ser o reconhecimento da missionariedade como base da vida cristã e, automaticamente, da vida presbiteral. É verdade que as Diretrizes para a Formação dos Presbíteros da Igreja no Brasil têm orientações para que o presbítero seja discípulo-missionário, inclusive destacam cinco aspectos essenciais, a saber: “O encontro com Jesus Cristo, a conversão, o discipulado, a comunhão e a missão” (Doc. 93 CNBB 92; cf. DAp 278). No entanto, enquanto não superarmos a ideia de missão como dimensão, dificilmente evoluiremos na formação missionária dos futuros presbíteros.
É imperioso refletir a missão na dinâmica do encontro (ser com os outros). Para isso, só uma renovação da consciência, capaz de acolher a missionariedade como dom, irá possibilitar que assumamos uma vida missionária contagiante, principalmente na convivência com outros seminaristas, proporcionando a participação na vida divina, como fez Jesus. Assim, a missão deixa de ser atividade pastoral organizada ou conceito eclesial e se torna reflexo do que Deus é, fazendo-nos viver diariamente na lógica do seu amor, aproximando-nos dos outros e conduzindo-os pelo caminho do Evangelho. Isso deve acontecer em todo nosso discernimento vocacional, não apenas nos finais de semana, quando estamos em serviço pastoral nas paróquias.
Portanto, a grande saída para superarmos a lacuna presente na formação presbiteral está entre a passagem da compreensão geográfica da missão para o âmbito da consciência. E os COMISEs podem ajudar muito nessa tarefa, pois missão é uma questão de identidade. Olhando para Jesus, vemos que sua pessoa e missão coincidem. Que passemos de uma compreensão missionária do fazer para o ser, “tendo os mesmos sentimentos de Cristo” (Fl 2,5), a fim de sermos seus autênticos discípulos-missionários.
* Seminarista da Diocese de Livramento de Nossa Senhora (BA)