Segunda meditação da Quaresma: A ciência da sede

Durante toda esta semana, o Papa Francisco se encontra em Ariccia, nas proximidades de Roma, para os Exercícios Espirituais de Quaresma. Até o próximo domingo (25/02), estão suspensas todas as audiências públicas do Santo Padre, inclusive a Audiência Geral de quarta-feira, e as homilias na Casa Santa Marta.

Na manhã de segunda-feira, após as orações, o Pontífice e os colaboradores prosseguiram o retiro iniciado no domingo. Este ano, pela primeira vez, o pregador vem de Portugal.

A segunda meditação proposta pelo Pe. José Tolentino de Mendonça ao Papa e aos seus colaboradores foi dedicada ao tema “A ciência da sede”.

O tema foi inspirado na última frase pronunciada por Jesus no livro do Apocalipse (Ap 22, 17), “Quem tem sede, venha”.

O sacerdote português alternou citações bíblicas a obras de teólogos, escritores, poetas e dramaturgos como Milan Kundera, Padre Henri de Lubac, Emily Dickinson, Eugène Ionesco, Saint-Exupéry.

No trecho do Apocalipse, as palavras usadas são “quem tem sede”, “quem quiser” – expressões que se referem a nós, afirmou Pe. Tolentino. “Estamos tão próximos da fonte e vamos para tão longe, perdidos em desertos, em busca da torrente que nos mate a sede e ignorando assim ‘o dom que Deus tem para nos dar’.”

A dor da nossa sede

Não é fácil reconhecer que sentimos sede, prosseguiu o sacerdote, “porque a sede é uma dor que se descobre pouco a pouco dentro de nós”, por trás das nossas habituais narrações defensivas ou idealizadas.

Há uma violência no mundo e em nós mesmos que vem da sede, do medo da sede, do pânico de não ter as condições de sobrevivência garantidas. “Nós nos revoltamos uns contra os outros. A dor da nossa sede é a dor da vulnerabilidade extrema, quando os nossos limites nos comprimem.”

O sacerdote português citou o consumismo dos centros comerciais, mas ressaltou que não devemos nos esquecer que existe também um consumismo na vida espiritual. As sociedades que impõem o consumo como critério de felicidade transformam o desejo numa armadilha.

O objeto do nosso desejo é uma entidade ausente, um objeto inesgotável. O Senhor, porém, não cessa de nos dizer: «Quem tem sede, venha; quem quiser, tome de graça da água da vida».

O caminho da nossa sede

Para o Pe. Tolentino, existem muitos modos de enganar as necessidades que nos dão vida e adotar uma atitude de evasão espiritual sem jamais, porém, se conscientizar de que estamos em fuga.

Também aqui, como em outros âmbitos da vida, afimou, a verdadeira conversão não consistirá em belas teorias, mas em decisões que resultem de uma efetiva conscientização das nossas necessidades.

Nem que fosse um único copo de água

O trecho do Apocalipse volta ao final da meditação. “Quem tiver sede, venha …” Certamente não bebemos para matar a sede. Jesus sabe que um simples copo de água que damos ou recebemos não é algo banal. É um gesto que dialoga com dimensões profundas da existência, porque vai ao encontro daquela sede que está presente em todo ser humano, e é sede de relação, de aceitação e de amor.

“Carregamos conosco tantas sedes. A sede é um patrimônio biográfico que somos chamados a reconhecer e do qual somos gratos. Depositemos em Deus a nossa sede.”

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